terça-feira, 6 de abril de 2010

74. Etéreo

74. Etéreo

Com os olhos entreabertos meus dedos apenas deslizam sobre o teclado, que por si só, escreve. Meu sentimento é concreto, meu conhecimento é vago. Minhas emoções, meus sentidos estão à flor da pele. Sinto cheiros e gostos que pairam por minha lembrança. Vejo paisagens que já se foram, ouço notas que ainda nem existem, minha pele percebe uma suave brisa que escorre por todos os cantos a meu acesso. Agora sou além de meu corpo. De fora me percebo e compreendo que nada sei além do que posso perceber. Nada entendo além do que toco, vejo, ouço, sinto. Sou tão ínfimo quanto eterno, tão suave quanto denso, e tão quente quanto as águas do pacífico. Nada sou.

Agora com os olhos encharcados, tudo é névoa, tudo é neblina. Minha audição se fecha, minhas memórias se esvaem, minha pele é esquecida. Volto a mim, não me percebo, nada sinto. Sinto que sou forte, sou gente, tudo sei, tudo sou. A partir daí minha humanidade desvirtuosa retorna a minha personalidade frágil e tão corruptível quanto corrompível. Se antes divino agora sou carne. Se pude um dia experimentar a harmonia do movimento subatômico agora me peso sobre o chão, duro, muito duro, difícil de suportar sem dor, sem lástima.

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