86. Velho²
Fronte ao espelho quebrado do banheiro vejo uma lágrima que de meu olho brota, escorre molhando minha face e desmanchando meu sorriso. Diante de mim mesmo, aos prantos, sou nostálgico, fraco e envergonhado. Minha pele não é mais tão lisa como em outrora, olheiras e rugas já se alastraram, agora com meus quase setenta e poucos anos nada sou além do que ainda consigo me lembrar. Minha memória é pouco confiável, minhas lembranças nem sei ao certo se me lembro ou se ainda as crio. Sinto saudades de quando eu queria e podia correr, de quando ainda tinha audição para ouvir o canto dos pássaros e me incomodar com o grilo atrás de alguma misteriosa porta. Queria eu poder ainda ter visão para que eu visse o trabalhar das formigas incansáveis e frágeis, como eu. E simplesmente poder sentir o amor que não conheço mais, queria que todo esse sentimento de pena se transfigurasse no puro amor que eu já, por muitas vezes, dediquei a todos que hoje me cercam.
Agora velho, sou a espera do que mais temo. Quando me vêem sabem, apenas espero. Não tenho mais nenhuma vida, mas também, ainda não tenho a morte.
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